BERTRAND SAKY TCHÉBÉ – “NO STRESS, HAPPYNESS, PEACE AND LOVE”: OS PRINCÍPIOS BÁSICOS DA DIDÁTICA DO CORAÇÃO E A DANÇA GBE-GBE



 Saky como chamamos aqui é um artista transdisciplinar, canta, dança, toca percussão, compõe canções, entre outras habilidades.  Ele dançou com o Balé Nacional da Costa do Marfim desde 1993, também foi membro da Cia Afrika Bikonda, dirigida pelo mestre camaronês Jean-Jacques Yén dito Nilomkop Dikoaà em 1996. Foi coreógrafo da Cia Étincelles em 1997 , e após se tornou membro da companhia “ ler Temps” de Andrea Ouamba (premiado nos Encontros Coroegráficos de Paris) em 2003 e 2004. Saky aprofundou seus conhecimentos sobre as Danças contemporâneas e tradicionais  africanas e ocidentais na Ècole de Sables em Toubab Dialaw. E desde 2004 ele é membro da Cia. Jant-Bi de Germaine Acogny. Em 2011 se formou professor de danças pelo CND (Centro Nacional de Danças de Paris), e desde então vive e trabalha em Dakar ministrando aulas na Ècole de Sables, dançando na Cia Jant-Bi e dirigindo sua própria Cia. Syncrho.

Tem uma didática que se baseia em 4 princípios  “No Stress, Happyness, Peace and Love”, com um senso de humor maravilhoso e grande incentivo à persistência, é um professor incrível. Com ele cantamos e dançamos a Dança Gbe-Gbe da Costa do Marfim, uma dança rápida e muito voltada para à terra.

Para Saky uma das coisas mais importantes para se fazer arte é a mobilização das emoções, é a transformação do que se passa dentro do coração em música, dança e etc, só assim a arte pode ser viva e pulsante. Incluir a emoção no processo de fazer arte (independente de ser um estágio de aprendizagem) é o que assegura a presença do artista na aula e na cena, a aula serve para nos acostumarmos com esse estado de atenção, e a cena é onde esse trabalho aparece e torna o artista mais forte, mais potente. No entanto, Saky acredita que o processo de aprendizagem só acontece com o envolvimento afetivo do educando, sem esse envolvimento o que acontece é um registro passageiro que será esquecido em breve.

A repetição é um outro ponto importante da didática de Saky, com uma forma bastante engraçada de lidar com tudo, ouvimos muitas vezes: “hoje você não consegue, mas amanhã você conseguirá!” E voltando muitas vezes ao início, foi nos dando um corpo dentro da dança complexa que é o Gbe-Gbe. Mas não era repetição pela repetição apenas, era repetição com metas, com sensações, com o  coração... No entanto, Saky salienta que é muito importante termos a noção de que a Dança que ele nos ensina é inspirada na dança tradicional, mas não é dança tradicional, o tradicional ocupa outro lugar e outros espaços dentro das comunidades africanas. A dança que aprendemos é elaborada e estudada para a cena, isso vai de encontro com aquela mania de falar de África enfatizando o “tradicionalismo”, o “primitivismo”. A dança cênica africana existe há muitos anos e tem um processo de elaboração bastante complexo, que passou por uma codificação detalhada dos passos inspirados nas danças tradicionais. Nesse momento a dança africana passa por um grande processo de transformação, iniciado por Germaine Acogny, no entanto, tem uma base bastante sólida de estudo da corporalidade e energia presente nas danças codificadas e elaboradas a partir das danças tradicionais.

“ A dança da Costa do Marfim trabalha a relação entre o centro do corpo e a terra, o que faz com que o centro do corpo se fortaleça, porém o centro do corpo é forte e móvel, e toda essa força e mobilidade que está na coluna e bacia, e se espalha por todo o corpo”, diz Saky, que acredita ser uma dança muito rica para se trabalhar a potência cênica do bailarino, no entanto, para que isso aconteça é necessário entender a arte como um todo pulsante: a dança não está separada da música, que não está separada do mundo, dentro das canções que cantamos em sala de aula pedimos perdão a mãe terra pelo mal que temos feito a ela, lhe pedimos consciência.

Para Saky engajamento e resistência estão interligados e basicamente significam a possibilidade de “ser sem fronteiras”, ou seja, poder ser como somos com nossa cor e cabelos, com nossas forças e fragilidades. Estar engajado nessa consciência de sermos nós mesmos, é manter-se todos os dias com firmeza, e não abrir mão dessa consciência e forma de agir, a luta é diária e necessária.


GBE-GBE

O Gbe-Gbe é uma dança que faz parte de um ritual funerário, surgiu a partir dos Gurus Sanfra da Costa do Marfim, que “inventaram” e foram ensinando a dança para as próximas gerações. O canto acompanha a percussão e faz parte da dança tanto quanto os passos, não há separação entre uma coisa e outra.

Dentro da roda tradicional há os passos de base mas os bailarinos entram na roda e fazem movimentos improvisados tendo sempre uma relação muito forte com os músicos. Toda a mobilidade do corpo está na relação centro do corpo (baixo abdomem e bacia) e coluna movendo-se em relação a terra, no entanto, mesmo com algumas características gerais, há diferentes formas de dançar o Gbe-Gbe por toda a Costa do Marfim.

É uma dança para iniciados e apenas os homens da comunidade podem dançar, o melhor dançarino dentro de uma comunidade é muito respeitado e recebe o nome de “banon”. A dança tem uma dimensão festiva para honrar o morto, porém carrega um senso esotérico e místico.

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